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O Grande Lebowski

(The Big Lebowski, EUA/GBR, 1998)

Comédia
Direção: Joel Coen
Elenco: Jeff Bridges, John Goodman, Julianne Moore, Steve Buscemi, David Huddleston, Philip Seymour Hoffman, Tara Reid, Peter Stormare, Flea, Torsten Voges, John Turturro, James G. Hoosier, Ben Gazzara, Sam Elliott
Roteiro: Ethan Coen, Joel Coen
Duração: 117 min.
Nota: 9 ★★★★★★★★★☆

Não é fácil imaginar que a inércia humana possa ser tema de filme, mas Joel e Ethan Coen (Onde os Fracos Não Têm Vez) nos provaram que pode sim. E dos bons. O Grande Lebowski é uma espécie de ode à apatia, ao não fazer nada além do que a situação o empurra a fazer sem grandes esforços, mesmo que haja alguma complicação.

O filme se passa em 1998, início de uma espécie de guerra fria entre EUA e Iraque. Jeffrey “O Cara” Lebowski é alguém que vive muito bem com a anti-proatividade. Desempregado, com cara de hippie que nunca conseguiu voltar de Woodstock, passa os dias com o cabelo desgrenhado, vestindo bermudas e chinelos e sua única preocupação é o jogo de boliche com os amigos.

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A vida de “O Cara” muda quando ele é confundido com um homem rico de mesmo nome, conhecido como “O Grande Lebowski”. Os homens que o confundem, além de agredi-lo, urinam no tapete que “completava a sala”. Encorajado pelo melhor amigo, “O Cara” resolve tentar recuperar o tapete perdido na casa do ricaço homônimo. E essa é a única atitude que realmente toma no filme.

Levado pelos acontecimentos e mal conselhos, o anti-herói criado pelos irmãos Coen acaba se encolvendo numa tumultuada trama de sequestro. Não faltam mentiras, problemas familiares, mal entendidos e figuras estranhas na história.

O “pequeno” Lebowski está sempre acompanhado de seus dois melhores amigos, Walter Sobchak, um ex-veterano do Vietnã aficcionado pela guerra, e Donny Kerabatsos, um cara legal que, extremamente submisso, é incapaz de terminar uma frase sem ser interrompido. “O Cara” também se envolve com Maude Lebowski, filha de seu homônimo e artista plástica que gosta de pintar seus quadros pendurada pelada no teto; com uma gangue de sequestradores que fez sucesso como banda musical nos anos 80; capangas burros de um não menos estranho diretor de filmes pornográficos e um exótico jogador de boliche chamado Jesus. Sem falar no próprio Grande Lebowski, um homem intolerante e prepotente que passa os dias passeando pela casa em sua cadeira de rodas automatizada, sua esposa mimada e oferecida e seu secretário pessoal tímido e boa gente. O desfile de personagens é quase tão maluco quanto as viagens psicodélicas de “O Cara”.

No meio de tanto tumulto e reviravolta, a apatia de “O Cara” chega bem perto de ser angustiante. Pouco tempo depois do início do filme, o espectador já sabe que pouco, para não dizer nada, dos anseios e projetos matutinos do rapaz se realizarão ao final do dia e depois das muitas doses de White Russian e vários cigarros de maconha. A personalidade paradona e chapada contrasta com toda a movimentação de uma história cheia de acontecimentos.

O roteiro escrito pelos irmãos Coen tem muita coisa a dizer e funciona perfeitamente, equilibrando bem o tumulto e a calmaria, sem se perder no meio de tantos personagens, situações esdrúxulas e ousando até na hora de usar recursos potencialmente problemáticos como a narração, que aqui funciona muito bem, estabelecendo um vínculo entre o narrador e o público.

Mas muito da força do filme vem do carisma de Jeff Bridges (Bravura Indômita), que parece ter assumido a personalidade de todos aqueles “Caras” que todo mundo já teve o prazer de conhecer e ainda emprestar à mistura de todos eles um charme especial. A atuação encontra companheiros à altura como John Goodman (O Artista), Steve Buscemi (Cães de Aluguel), Julianne Moore (Magnólia), Peter Stormare (Fargo), Ben Gazarra (Anatomia de um Crime), John Turturro (E aí, Meu Irmão, Cadê Você?) e a dupla Philip Seymour Hoffman (Capote) e David Huddleston (Banzé no Oeste), que numa primeira olhada rápida podem parecer a mesma pessoa, mas não são.

Tudo está milimetricamente calculado, como é praxe nas obras dos Coen. Desde pequenos detalhes na direção de arte de John Dexter (A Lenda do Cavaleiro sem Cabeça), passando pela fotografia de Roger Deakins (Um Sonho de Liberdade) e chegando até a personalidade de “O Cara” que, quando analisada mais de perto é, na verdade, um extremo de outros protagonistas presentes na filmografia dos irmãos. Pessoas que, independente do que aconteça com elas, deixam a vida seguir e se deixam levar pelos acontecimentos. O que faz com que o Pequeno Lebowski seja mesmo “O” cara de todos esses outros caras inertes.

Um Grande Momento

São muitos, mas nada te prepara para conhecer Jesus.

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Links

IMDb [youtube]http://www.youtube.com/watch?v=r_GCRFRcWxA[/youtube]

Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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