Crítica | Festival

Na Ponta dos Dedos

A solidão de estar apaixonado

(Fingernails, EUA, GBR, 2023)
Nota  
  • Gênero: Romance
  • Direção: Christos Nikou
  • Roteiro: Christos Nikou, Sam Steiner, Stavros Raptis
  • Elenco: Jessie Buckley, Riz Ahmed, Jeremy Allen White, Luke Wilson, Christian Meer, Amanda Arcuri, Annie Murphy, Katy Breier, Clare McConnell, Nina Kiri, Jim Watson
  • Duração: 113 minutos

Se o primeiro sinal de problemas cardíacos são manchas nas unhas é possível dizer que relacionamentos amorosos podem dar certo ou não. A ideia estapafúrdia está por trás do longa Na Ponta dos Dedos do diretor grego Christos Nikou. Em uma sociedade em tempo indeterminado, onde até mesmo a bíblia ganhou uma versão exclusiva, testes de compatibilidade reduziram o número de divórcios. Eles são feitos arrancando uma unha de cada parceiro, daí o título do filme, e comparando-as numa máquina. Casais positivos podem ficar juntos e os negativos não têm futuro, podendo desistir da relação.

Anna (Jessie Buckley) vive uma relação estável e relativamente feliz com Ryan (Jeremy Allen White), apesar de a rotina já ter deixado as coisas meio mornas. Ela começa a se questionar sobre a paixão e a sentir uma curiosidade pelo funcionamento do amor. É assim que se inscreve para um emprego em um instituto especializado gerenciado por Duncan (Luke Wilson), onde passa a ser treinada por Amir (Riz Ahmed). O nonsense vai se acomodando a uma trama padrão. Sabe-se onde tudo aquilo vai dar, o trajeto que vai ser percorrido, mas o que se encontra pelo caminho é curioso e diferente.

Nikou, que escreve o roteiro ao lado de Sam Steiner, Stavros Raptis, em seu romance tradicional discute a solidão do ser humano e as dores e frustrações da paixão, em especial em um universo onde ela perde espaço para o cartesiano. Além de sua casa, onde a relação já segue uma programação sem muito espaço para inovações, Anna passa a conviver diariamente com casais que são condicionados a criar conexões mais fortes, seja ouvindo e cantando músicas em francês, assistindo a filmes de Hugh Grant ou pulando de paraquedas.

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Porém, o Na Ponta dos Dedos tem elementos contrastantes salpicados sejam eles evidentes, como o casal de adolescentes Rob e Sally (Christian Meer e Amanda Arcuri), ou que chegam em pistas, como o quadro Os Amantes de René Magritte que está sendo carregado no fundo do quadro. Todos levam ao ponto principal do longa, a relação de intimidade que se estabelece entre Anna e Amir e que, à medida que se desenvolve, vai transformando o filme em todos os sentidos.

O tom frio vai perdendo espaço, há mais cenas de observação e alguns planos começam a ficar mais apurados. Há também um pouco mais de espaço para o humor, embora o tom melancólico nunca deixe de estar presente e é como se Nikou, ao lado de Marcell Rév, seu diretor de fotografia, e sabendo aproveitar bem a trilha musical de Christopher Stracey, conseguisse encontrar o tom do sentimento que vai se instalando. Em estrutura, não há nada que já não foi visto muitas vezes antes, com direito a clipe e aquelas situações que podem ser facilmente antecipadas. Não todas, que o diga Tolstói.

Esse ambiente tão conhecido que se estabelece contrasta com a lógica que causou estranhamento desde o começo de Na Ponta dos Dedos, reafirmando velhas máximas e o ideal do amor romântico que sempre será perseguido. Assim, é difícil não torcer pelo casal e não compreender o ponto em que as coisas chegam, talvez alcançando algo que não seja tão esperado para o filme que se estabeleceu até aqui, mas que tenta se aproximar de uma ruptura comum em outros filmes da mesma escola.

Um grande momento
Vendo dançar

[47ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo]

Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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