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Macbeth: Ambição e Guerra

(Macbeth, GBR/EUA/FRA, 2015)

Drama
Direção: Justin Kurzel
Elenco: Michael Fassbender, Marion Cotillard, Paddy Considine, Lochlann Harris, Kayla Fallon, Lynn Kennedy, Seylan Baxter, Amber Rissmann, Scot Greenan, David Thewlis, David Hayman, Jack Reynor, Brian Nickels
Roteiro: William Shakespeare (peça), Jacob Koskoff, Michael Lesslie, Todd Louiso
Duração: 113 min.
Nota: 7 ★★★★★★★☆☆☆

Shakespeare é eterno, não há dúvidas sobre isso. Mesmo que seus textos tenham sido escritos no século XVII, a precisão com que o Bardo de Avon captou os sentimentos humanos mais profundos faz com que sua obra sobreviva à passagem do tempo. Hábitos, crenças e posturas podem mudar, mas o ser humano continua sendo tão humano quanto antes, e esta humanidade está em tudo o que Shakespeare escreveu.

Em “Macbeth”, o foco é a cobiça e a ambição. Após uma profecia sobre sua futura coroação como rei, Macbeth, manipulado por sua esposa, Lady Macbeth, acaba tomando providências para realizar a previsão das três bruxas. O texto já foi adaptado para o cinema várias vezes, mantendo ou atualizando a ambientação imaginada por William Shakespeare.

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Alguns filmes tornaram-se clássicos, como Trono Manchado de Sangue, de Akira Kurosawa, ou as adaptações de Roman Polanski e de Orson Welles, mas nem todos conseguiram chegar tão longe assim e alguns ficaram marcados pelo equívoco, como é o caso do recente longa brasileiro A Floresta que se Move, dirigido por Vinícius Coimbra e recentemente exibido nos cinemas.

Uma adaptação interessante e respeitosa, embora visualmente ousada, Macbeth: Ambição e Guerra, de Justin Kurzel, consegue ficar entre os títulos que agradam. Filmado na própria Escócia, onde a trama original se desenrola, com roteiro de Jacob Koskoff, Michael Lesslie e Todd Louiso, há muito dos diálogos originais, interessantemente mantidos pela distribuidora nacional nas legendas em português.

Algumas passagens da peça foram suprimidas pela trinca de roteiristas, mas não fazem falta em um conjunto muito bem amarrado e completo. O respeito pela obra e uma certa reverência estão claros no texto, assim como a ousadia fica clara na concepção visual de Kurzel, que já assinou a direção do perturbador Snowtown e é o responsável pela adaptação do videogame Assassin’s Creed, que chega aos cinemas no final do ano que vem.

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Indo além de se apoiar apenas no texto e nas excelentes atuações de seu casal de protagonistas Michael Fassbender (Prometheus) e Marion Cotillard (Piaf: Um Hino ao Amor), o diretor Australiano, contando com a preciosa ajuda de Adam Arkapaw (Lore) na direção de fotografia, transforma seu longa em uma profusão de pinturas. Ele mescla cores quentes a passagens completamente sem cor, e usa os planos, ora abertos, ora fechadíssimos em close up, para aproximar e afastar o espectador dependendo do sentimento que gostaria de provocar em cada momento.

No meio de tanto deslumbre visual, duas passagens se destacam. A cena de batalha no início do filme, onde o diretor incorpora interessantes sequências em câmera lenta para ressaltar o aparecimento das bruxas videntes, aquelas que mudarão realmente a velocidade dos acontecimentos na vida de Macbeth. Outra é a cena em que conhecemos o desespero e desolação de Lady Macbeth, com os espectadores praticamente dentro daquela personagem.

Com a boa impressão visual, sobra interesse e dedicação ao texto do bom, velho e eterno Shakespeare. O modo como o diretor trabalha a obsessão e a ambição dos personagens, criando com ela um jogo entre os dois, é bastante interessante. A perda inicial, que devasta e esvazia define a grandeza do sentimento obscuro de forma tão condenável quanto compreensiva.

É curioso acompanhar a forma como esse sentimento vai se esvaindo de um personagem para tomar conta do outro, como uma doença transmitida pelo primeiro ao segundo, e que não traz nenhum consolo ou reparação àquele vazio inicial que destruiu as duas vidas.

Neste ponto, vale voltar às atuações da dupla Cotillard e Fassbender. Mais do que ter a oportunidade de mostrar suas capacidades interpretativas ao dar vida a um texto de Shakespeare, sonho de todo ator sério, os dois mergulham completamente em seus personagens e conseguem trazer muita verdade à complexa constituição do casal Macbeth.

Macbeth: Ambição e Guerra é um daqueles filmes que fazem o espectador sair do cinema satisfeito com o que acabou de ver. Não é a melhor adaptação do texto que já chegou aos cinemas, mas é um trabalho corajoso que ganha muitos pontos ao unir o repeito ao texto e a inovação visual, trazendo uma modernidade que nem sempre funciona como acontece aqui.

Um Grande Momento:
O arrependimento.

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Links

IMDb [youtube]http://www.youtube.com/watch?v=t3kIdC6jwGQ[/youtube]

Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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