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Um Filho

O vazio

(The Son, EUA, RUN, FRA, 2022)
Nota  
  • Gênero: Drama
  • Direção: Florian Zeller
  • Roteiro: Florian Zeller, Christopher Hampton
  • Elenco: Hugh Jackman, Zen McGrath, Laura Dern, Vanessa Kirby, Anthony Hopkins, George Potts, William, Felix e Max Goddard
  • Duração: 120 minutos

Meu Pai foi o cartão de visitas do dramaturgo Florian Zeller como realizador de cinema, e de cara ele ganhou dois merecidos Oscars: para si como roteirista, e para a impressionante interpretação de Anthony Hopkins no papel título. Parecia nascer um novo prodígio das telas, com uma meta de dar continuidade à sua trilogia teatral em novas adaptações cinematográficas, e essa semana estreia seu segundo filme sobre crônicas familiares, Um Filho. Todas as expectativas criadas para que encontrássemos novas camadas de rigor na mise-en-scene, novo encontro com um texto formidável, novas interpretações marcantes, tudo isso desce pelo ralo. Não há uma fagulha que seja a unir os dois filmes, nem em sua narrativa nem nas possibilidades de uma possível contínua excelência. 

A verdade é que, tudo que fazia do longa anterior uma experiência especial, com camadas de teatro sobrepostas às do cinema transformando o jogo como um todo, aqui é refém de uma banalidade absoluta. Um Filho é um longa qualquer, onde nada de relevante acontece, é dito ou resplandece, e o que vêm à tona é sua textura mediana, sem méritos visíveis. Estamos diante de um drama ambientado entre cinco atores, todos membros de uma mesma família unida por graves problemas e suas consequências psicológicas a um passado de abandono, que se reflete em um presente de reprodução das mesmas ações. Na superfície, temos um produto de desenvolvimento básico, sem muita reverberação de qualquer ordem. 

Um Filho
Divulgação

Mesmo que não haja comparação, ainda assim Um Filho é um filme estéril. Nem na zona do ‘teatro filmado’ o filme pode ser jogado, ainda que se passe essencialmente entre quatro paredes, mesmo que essas paredes sempre mudem (são diversos cenários); não há nem mesmo o charme, muitas vezes engessado, dessa estrutura. Não há personalidade ali, e para um filme entrar nesse lugar trancafiado de uma peça, ele precisa exalar pré-disposição ao artifício, que simplesmente não existe. É uma composição inanimada, que obriga seus atores a uma base de complementar fisicamente o que não está no campo espacial, e o que temos em cena é um grupo que, por mais talentoso que seja, não consegue responder a uma falta de empenho que já vem do texto. 

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Se a ideia é boa quando capturamos a premissa, seu desenvolvimento é raso. São diálogos frios e repletos de didatismo, que vai com todo cuidado explicando sua compleição do início ao fim; não há o que conjecturar, porque todo o trabalho é desenvolvido pelo texto, que destrincha todas as situações, até só restar a frustração. A quem se interessar apenas por assistir a exposição de linhas de diálogos, que não representam qualquer desafio para o grupo de atores, e uma direção que também prima pelos tons pastéis, Um Filho é um programa que talvez agrade. O espectador que procurar algo além do mínimo de uma obra em lugar de surpreender, aqui a expectativa gera até desconforto diante da quantidade de oportunidades desperdiçadas. 

Um Filho
Divulgação

O elenco, então, não há o que fazer mesmo. Atrizes vindas de atuações celebradas (respectivamente História de um Casamento e Pieces of a Woman), Laura Dern e Vanessa Kirby parecem ter sido enganadas quanto ao teor do que poderiam apresentar, que é nada de muito representativo. Duas mulheres com talento tão evidente, aqui dispostas a estar em cena, quase que exclusivamente. Hugh Jackman ao menos tem a cena, onde uma catarse acontece; até então, ele vive no mesmo esquema das atrizes, em um compasso de espera de algo que nunca acontece, nem para o grave ou para o agudo. O jovem ator Zen McGrath é verde, e seria dele onde grande parte da exploração poderia ocorrer, mas com um texto tão inábil na hora de promover qualquer coisa, o rapaz não pode ser culpado. Sobra, lógico, Sir Anthony Hopkins, na única cena grandiosa de Um Filho, onde a culpa toda recai sobre seu incomensurável talento, um alívio muito fugaz de força. 

Há uma displicência no cuidado com relação a depressão na adolescência, principalmente na forma como o roteiro conduz seu clímax. Não cabe ao espectador escolher uma saída para a obra, e sim aceitar o acordo como ele se apresenta e julgá-lo como tal; pois bem, em uma encruzilhada criada por si mesmo, Um Filho apresenta suas armas finais e ambas são conclusões que prestam claro desserviço ao tema. Fosse feita a escolha que fosse, o resultado seria um desastre do ponto de vista moral, e é o que acontece. O sentimento, ao fim da jornada, é o de cansaço por não conseguir extrair nada além do medíocre dentro do que vemos, mas com a consciência de que nada poderia ser diferente com tudo o que é proposto… e que, no fundo, é quase nada. 

Um grande momento

Almoço com o pai

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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