Crítica | Streaming e VoD

Em Ruínas

Excesso que deu certo

(황야, KOR, 2024)
Nota  
  • Gênero: Ficção Científica
  • Direção: Heo Myeong-Haeng
  • Roteiro: Kim Bo-Tong, Kwak Jae-Min
  • Elenco: Ma Dong-Seok, Lee Hee-Joon, Lee Jun-Young. Roh Jeong-Eui, Ahn Ji-Hye, Jang Young-Nam, Lee Han-Joo
  • Duração: 104 minutos

Na contramão de outros projetos que não esperamos absolutamente nada, aparece de vez em quando um título que surpreende pelos caminhos que resolve tomar. O maior sucesso adulto da Netflix há mais de uma semana atende pelo nome de Em Ruínas, e poderia ser o mesmo filme de sempre. De alguma forma, até o é, mas aqui no caso não seria apenas um, mas alguns condensados em uma mesma produção. Essa é uma das características que mostram como a Coréia do Sul consegue estar sempre adiante mesmo quando não está tentando fazer nada demais. Ao final da jornada, temos a consciência de que passou por nós um caminhão desgovernado desses que fazem muitos estragos ao se chocar, e a principal vítima desse acidente deve ser a preguiça do espectador. 

Isso porque o filme atropela nossas expectativas com alguma facilidade, se o público deixar a visão desse universo tão caótico ocupar o campo de observação. E o responsável pelo caos generalizado é o acúmulo de gêneros, subgêneros e plots que são desenvolvidos durante pouco mais de 100 minutos. Temos o cinema catástrofe, temos a distopia futurista, temos os filmes sobre sociedades totalitárias, temos o cinema de gênero (no caso, os mortos vivos de sempre), temos um baita de um filme brucutu à moda antiga, e um tanto de comédia no molho. É muita coisa com que se preocupar, é verdade, mas sinto que o cinema sul-coreano tira essas possíveis desvantagens de letra, e entrega com Em Ruínas um pacote irresistível. 

Tem também o caso de que estamos tratando de uma espécie de continuação aqui. No mesmo dia que chegou à Netflix, cinemas brasileiros receberam o candidato ao Oscar desse ano da Coréia do Sul, Sobreviventes: Depois do Terremoto, o que pode também levantar o interesse do público. Contudo, é bom deixar claro que Em Ruínas não carece de explicações maiores para sua existência, porque são universos que correm quase como paralelos um do outro. Ainda assim, é bom observar como o cinema do país não perde o fôlego há muitos anos (quiçá décadas), e continua produzindo joias escondidas como esse filme aqui, que apesar do grande sucesso da Netflix, precisa que suas habilidades sejam debatidas para que ele não passe em branco. 

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Ao pensar, por exemplo, em uma produção igualmente cheia de elementos como o primeiro filme da saga Rebel Moon, percebemos como sobra organização e sensibilidade para perceber as próprias capacidades. O caso de Em Ruínas é realmente daqueles raros onde observamos tantas possibilidades serem empilhadas, e tal decisão conseguir ser tratada com muita qualidade entre todos os campos. De maneira frontal, o diretor estreante Heo Myeong Haeng não tem medo de explorar a centralidade de seu cinema, amplamente ligado aos códigos de gênero, a maioria com exploração exemplar de suas possibilidades. De acordo com o avanço da narrativa, vamos observando o trabalho cada vez mais maduro dos envolvidos.

As coreografias das sequências de ação são impressionantes constantemente, e não é uma surpresa quando descubro que o diretor é originalmente um profissional da coreografia de ação. Em Ruínas, ao tratar seu roteiro de maneira tão básica, mostra que isso não é um problema se você consegue ativar o máximo de sua produção em outras searas. Como na maneira muito desavergonhada em como trata a violência de seu filme, por vezes até um pouco cartunesca, e em outras apavorante com sua entrega pelo grotesco. Isso é louvável em tempos tão politicamente corretos e cheios de restrições, que acabaram por podar as liberdades de projetos que poderiam ousar ainda mais esteticamente. Esse definitivamente não é um problema aqui. 

Não atrapalha em nada o fato de Em Ruínas ser protagonizados por tantos bons atores, com carisma à toda prova. Encabeçando a turma, Ma Dong-Seok (ou Don Lee) volta a mostrar seu tipo consagrado em Força Bruta e Invasão Zumbi. Ao lado da exímia lutadora Ahn Ji-Hye, que tem sequências inacreditáveis como a sua luta final, o protagonismo do filme é composto um grupo de conexão muito fácil; acreditamos em cada mocinho e em cada vilão do filme, porque também trata-se de conseguir reportar todos esses sentimentos em quem assiste. É um pacote de respeito esse que está sendo oferecido como sucesso na Netflix, com uma direção de arte acachapante, onde a luta pela sobrevivência de um grupo poucas vezes foi tão deliciosamente confusa. 

Um grande momento

O corredor do prédio

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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